Entrevista Erol Alkan

Erol Alkan à conversa com Susana Pomba em Londres  

Num dos festivais de Verão deste ano, enquanto esperava ordenadamente pelo próximo concerto, um rapaz aproximou-se de mim entusiasmado, quase esbaforido, a pedir-me para tirar uma fotografia à minha t-shirt. Assim o fez e foi embora contente, genuinamente contente. Visto essa t-shirt com alguma parcimónia e orgulhosa por ter tido tanta sorte em ter conseguido comprá-la -“E.R.O.L., Keeps Kids Dancing”. É impossível negar a importância de Erol Alkan. O mito que cresceu com rumores das noites de segunda-feira do clube Trash em Londres, mais tarde com os seus famosos mash-ups (“Can’t Get You Out Of My Head” + “Blue Monday” nos Brit Awards…), depois no desenrolar de um enorme catálogo de remixes que vivemos e que rapidamente se tornaram épicos, lançaram “trends” e que os mais cínicos ainda esperam para ver se se colam com cuspo ou com cimento. Esperemos mais uns anos mas sem dúvida que as remixes para “Believe” dos Chemical Brothers, “Do You Wanna?” dos Franz Ferdinand, “Boys From School” dos Hot Chip”, “Waters Of Nazareth” dos Justice, “Golden Skans” dos Klaxons ou “Mammoth” dos Interpol, vão ditar muita coisa da História, que se escreverá depois, do que hoje vivemos. E mais se adivinha das suas colaborações recentes, como produtor, com bandas como os The Long Blondes, Mystery Jets ou Late of The Pier. E das suas aventuras como Beyond The Wizard Sleeve ou Mustapha 3000. Mas nada disto se completa sem estar lá. Num dos seus sets. Gosto de pensar que E.R.O.L. é definitivamente um dos grandes maestros. E só tem trinta e poucos anos, imaginem o que vem aí deste homem (de quase 2 metros!) que aos 4 anos, mesmo sem saber ler, conseguia distinguir os discos pelas rodelas e assim fazia de DJ para a mãe. 

O Lux está a comemorar 10 anos, mas estamos concentrados no futuro. Tens planos para a próxima década?

Eu nunca planeio nada. Tudo o que aconteceu nos últimos 10 anos tem sido uma progressão natural. Vou de uma coisa para outra. Em termos de carreira isto é quase uma coisa “suicida” – não saber o que se vai fazer. Eu acho isso entusiasmante. Quando comecei a gerir um clube (Trash) comecei-o porque era isso que queria fazer, queria tocar, ter a liberdade para o fazer e tudo se desenvolveu daí. Comecei a ser conhecido como DJ, e depois a andar pelo mundo e a trabalhar com bandas. Todas estas coisas aconteceram naturalmente, eu nunca sonhei que um dia fosse fazer isto ou aquilo, tornar-me num produtor ou num DJ. Não que não tivesse a ambição. Sinto é que a única coisa que realmente nos entusiasma criativamente, ou em termos artísticos, é aquele “spark” que nos leva a fazer alguma coisa. Quando sentimos que o que estamos a fazer é válido. Tem sido tudo muito natural. Eu só faço coisas quando me sinto verdadeiramente inspirado. 

Estamos a chegar ao fim desta década. Existe a tendência para pensar no que a define. Nos anos 90 foi o “boom” da dance music, das raves. Achas que estes últimos anos têm sido definidos pela junção do rock e da música de dança?

Eu sempre tive a consciência dessas duas coisas juntas. Para mim o que está a acontecer agora não é diferente do que o que os Chemical Brothers estavam a fazer no início dos anos 90. Se quiseres pensar na música de dança e no rock a fundirem-se basta pensares em muitas das produções britânicas pop dos anos 80. 

Mas agora não vês as coisas com mais clareza? Nesta nova cena?

Apercebemo-nos mais mas não acho que a música tenha ficado mais potente ou mais eficaz. Sempre ali esteve. Acho que posso falar mais ou menos por toda a gente envolvida nesta “cena” – ninguém planeou juntar nada. Acho que é o nosso gosto natural no que diz respeito à música. Nenhum de nós acha que tem que seguir fielmente uma só coisa. É tudo muito diferente. O som dos Justice, por exemplo, é diferente do dos tipos da DFA, ou dos Soulwax, ou daquilo que eu faço. Somos todos muito diferentes. No fundo, nós só crescemos a gostar mais ou menos dos mesmos discos, a gostar de certo tipo de artistas e de música pop. Foram as primeiras coisas que experienciámos.

Mas têm uma nova maneira de abordar as coisas. 

A minha maneira principal de o exprimir é trabalhando com bandas. Eu não tenho uma banda, não pego nos instrumentos, não da maneira como os Soulwax são uma banda, por exemplo – cada um de nós tem a sua maneira de o exprimir, diferentes veículos. Não são meia dúzia de duos ou meia dúzia de “one man bands” com teclados e guitarras.. 

As tuas remixes têm muito humor, concordas com isso?

Sim, de certa maneira sim. Acho que todas têm diferentes níveis de humor, tristeza ou alegria. Depende. São todas muito diferentes, tento focar-me no que a canção tem e tento trazer mais disso cá para fora. Claro que enfatizo esses elementos porque me relaciono com eles, talvez outra pessoa tirasse algo diferente. Com certeza. 

Estava a pensar na remix de “Mammoth” dos Interpol, em que colocaste aquele enorme silêncio, quase como uma piscadela de olho aos próprios Interpol, e aos seus famosos breaks…

Sim, aquele drama deles, é verdade. Mas, por exemplo, os Rub-n-Tug quando passam essa música passam-na muito lenta, com o pitch no – 8, e soa tão bem! Não era a minha remix preferida de sempre, mas quando ouvi aquilo tão lento, achei super psicadélico, gostei muito. 

Não resisto em perguntar a história por detrás da t-shirt “E.R.O.L – Keeps Kids Dancing”. Como é que surgiu? 

Mais ou menos há dois anos recebi um email de um tipo a dizer que gostava muito do que eu fazia e que queria fazer uma t-shirt e se me importava que ele fizesse umas dez para ele e para os amigos. Eu disse –“claro!”, mas pedi-lhe para me mandar uma também porque gostava de ver. E um mês depois ele mandou-me a t-shirt e eu pensei “Uau”. Eu costumava usar a t-shirt “D.A.R.E. To Keep Kids Off Drugs” e por acaso até já tinha pensado colocar no meu site, a dizer “E.R.O.L.” e mais qualquer coisa… O Xavier dos Justice até disse que devia dizer – “E.R.O.L. says no to boring trouble house” (risos) e nós íamos fazer isso e mudar constantemente o slogan. Mas o meu amigo Rory Phillips que construiu o site disse que a ideia era uma porcaria. Não lhe devia ter dado ouvidos! (risos). Então este miúdo veio com a mesma ideia do “E.R.O.L.” mas colocou o “Keeps Kids Dancing” e eu gostei imenso. 

A t-shirt “D.A.R.E.”, é de uma fundação americana contra as drogas e violência, e esta agora falava de manter os miúdos a dançar. E dançar é uma acção tão expressiva. Para mim é o equivalente da felicidade. Eu nunca vi ninguém triste enquanto está a dançar. É o melhor que as pessoas podem fazer enquanto estão num clube. A emoção que transmite é fantástica. Depois escrevi-lhe a dizer que gostava muito da t-shirt e que gostava de fazer algumas. Mandei-lhe algum dinheiro pelo design e depois pensei – faço 100, dou 50 e vendo as outras 50 para cobrir os custos. Quando as coloquei no site venderam-se em menos de uma hora! Comecei a achar que devíamos fazer mais, e então fizemos mais 100 que se venderam num dia. Depois comecei a ver a t-shirt no ebay por 50 libras e não achei isso bem. Continuámos a vendê-las baratas, são 14 libras, o que no fim de contas, depois do IVA e dos impostos, é mesmo barato. Estamos sempre a tentar repor stocks. 

Eu gosto muito da ideia que a t-shirt é uma mensagem positiva. Um dia quando eu já estiver todo gasto eles vão usar isso para me deitar a baixo, estou mesmo à espera, tipo – “ele já não consegue pôr os miúdos a dançar” (risos). Mas daqui a muito tempo, espero eu. 

Percebe-se que ainda te dá muito prazer o DJing.

Adoro. Faz-me sentir sem idade. É o meu escape natural, a música e estar em sítios cheios de pessoas. Não digo num sentido megalómano, mas é como ter um género de controlo, saber que o que está a acontecer naquele momento está a acontecer “naquele momento” e que em meia hora vai ser outra coisa diferente. 

E o que se segue? No futuro próximo?

Estou a fazer música, muita música, muita coisa diferente. 

Muita produção, muitas remixes?

Muitas remixes não, agora estou a fazer uma para os Franz Ferdinand. Beyond The Wizard Sleeve… estamos a tentar mudar um bocado, é bom. Vou fazer mais coisas com as bandas com quem trabalho. Mas vou tentar não produzir tanto outras bandas, estou feliz com aquelas que tenho. Somos uma família. Não acredito que esta seja a altura ideal para me “vender” como produtor. A metade do trabalho de produzir, a parte importante, é trabalhar perto das bandas, é o trabalho que fazes também fora do estúdio. Não é só aparecer, mexer nuns “faders”, dizer às guitarras para baixarem o som, e depois ir-me embora. Há mais do que isso (risos). 

Mas se tivesses um convite de uma banda de que gostasses muito, uma banda mais conhecida, aceitavas?

Já tive isso. Bandas que cresci a ouvir, que fizeram alguns dos meus álbuns favoritos de sempre. Disse-lhes que não, bem, no fundo não dei continuação a esses convites, não os persegui. Porque, de alguma maneira, para mim é como se estivesse a ver um membro da minha família nu. Não há nada sexual nisso (risos). E para mim tem que existir alguma coisa… não senti, no fundo que estivesse certo. E também porque às vezes podes estar tão deslumbrado com alguém e não te expressar correctamente… podes dizer “uau, está óptimo, soa maravilhosamente” e depois… Eu sou um bocado duro com as bandas com quem trabalho. Mesmo que eu lhes grite, ou que eles gritem comigo sabemos que estamos todos na mesma página, estamos a caminhar pela mesma estrada. E isso leva tempo e confiança. E é muito importante, vai-se construindo ao longo do tempo. Não acho que esteja num momento em que possa trabalhar com os meus heróis. 

Achas que algum dia estarás?

Ah sim, um dia quando conseguir ser cínico o suficiente. Acho que o cinismo ajuda. 

E estás a ir por esse caminho?

De certa maneira, sim… (risos). Mas acho que continuar a ter este “romance”, não ajuda muito.

E não existe nada que nunca tenhas feito e que queiras muito fazer?

Não sei. Tudo é novo para mim. Cada experiência é nova. Mesmo estar aqui a tomar este chá é uma nova experiência. Nunca te conheci antes, também é novo. Toda a gente baseia as coisas no “eu fiz isto, não o vou fazer outra vez”, mas para mim é diferente, cada momento é único, eu trato as coisas dessa maneira. Mas sei o que não quero fazer. Essas regras são limitações, não as tenho dessa maneira. 

O que esperas da noite no Lux? É um regresso muito aguardado, foi há muito tempo que cá estiveste pela primeira vez.

Estou muito honrado por estar neste grupo dos dez anos, é muito simpático da vossa parte, de me pôr nessa categoria. Talvez, como excepção, planeie essa noite! (risos). De maneira a não vos desiludir.

1 Response to “Entrevista Erol Alkan”


  1. 1 ZX.MMX

    Um Mestre !

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