Gavin Russom som e espaço

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Uma das figuras–chave da música electrónica e da cultura psicadélica da primeira década deste milénio, nos decks do Lux num ano que se perspectiva enorme

 

Uma sala, um P.A., um público, um sinal – som e espaço. Dois universos intrinsecamente ligados à música, raras vezes interiorizados e manuseados com tanta ciência e carinho como por Gavin Russom. Construtor de sintetizadores e parafernália electrónica, escultor, profeta do cósmico e do estelar, focado em desenhar aquilo a que soam “as sensações (…) quando estados psicológicos e espaços físicos interagem”.

O mundo começa a dar pela sua presença com o primeiro lançamento para uma DFA que, à época, acabava de se mostrar ao mundo com singles clássicos de LCD Soundsystem, The Rapture e a obra-prima de uma coisa ainda hoje sem nome que é “Beaches & Canyons”, dos Black Dice. “El Monte”, esse primeiro 12” de Delia Gonzalez (sua colaboradora de longa data) & Gavin Russom, bem como o LP que se seguiu, “Days of Mars”, tornaram-se de imediato dois marcos da electrónica e psicadélica desta década. Ajudaram de forma fundamental a influenciar e afirmar o ideário cósmico no panorama da produção de música de dança actual, trabalhando os ensinamentos dos mestres do kraut de Manuel Göttsching, Tangerine Dream e Klaus Schulze de como alcançar as estrelas através do som. Se hoje o cosmic disco, a op art imprópria para epilépticos ou o ideário new age são enormes espaços de criação artística em vários domínios, responsabilidade devida a Russom. 

Construindo o seu vocabulário através de máquinas que ele mesmo fabrica, pode moldar o som desde o primeiro momento até à arquitectura final das suas peças com controlo absoluto em todos os processos. Génio do impacto acústico no corpo e no espaço, ajudou a montar o estúdio Plantain da DFA, para além de ter construído uma parte fundamental do arsenal sónico utilizado pelos Black Dice. Para os seus registos, a definição, textura e poder sonoros são avassaladores. Camadas e camadas de sintetizadores como fractais a aparecerem, a sobreporem-se, a desaparecerem, em constantes fugas e aproximações ao infinito, num corpo acústico indomável, de graves imponentes e leads radiantes.

É música para a pista de dança que pode existir na cabeça de cada um de nós, se para aí estivermos virados e para aí quisermos viajar. Contudo, terá havido sempre uma curiosidade de provavelmente todos os que alguma vez escutaram estas faixas, de como seria se houvesse um kick e um beat a comandá-las a pulso para o céu.

Num movimento oposto ao que Omar- -S fez com o já clássico do techno cósmico do ano passado “Psychotic Photosynthesis”, Russom, depois de anos sem dar o 4/4 que põe o universo a rodopiar, acaba de o deixar cair com a maior autoridade e feeling. Caso em questão a recente remistura para “Oasis” de Petar Dundov, um exercício monumental em progressivo e ascese através de sintetizadores modulares, para quem sempre quis que o trance tivesse bom gosto e que o techno tivesse nascido de uma explosão meteórica. 

Após alguns anos discretos no campo da edição, 2009 prevê-se um ano com elevado ritmo de produção para Russom (e com kick drums). Está planeado um lançamento em nome próprio, bem como o primeiro de uma série de três 12”s enquanto Black Meteoric Star, tudo sempre na DFA. Este último um projecto seu a solo inteiramente dedicado a uma revisitação, actualização e progressão do acid house, género com o qual contacta desde os primeiros anos da TRAX (mais especificamente desde que escutou em 1988 “The Groove”, do maxi “Jack The Beat” de Lidell Townsell), cujas faixas começam a aparecer aqui e ali em sets. “Death Tunnel”, uma delas, é hino instantâneo, acid de 2009 para 2009 voar como ninguém voou antes, enquanto outra, “World Eater”, é puro jack para astronautas sem truques. Os três maxis terão artwork do próprio Gavin, cada um deles  acompanhado com posters que fazem parte de uma série de objectos com intuitos sinestésicos – o som são as imagens são o som. 

Numa entrevista em Junho para a Fact Magazine, Russom falava que “a pista de dança é um espaço muito importante (…) na paisagem cultural”. Para quem o ouve, é uma bênção que tenha tido o chamamento destes 4/4’s caídos do céu. Seja a nossa pista de dança uma da mente ou a do beat marcado, este será o ano em que Gavin Russom traz o espaço para a pista para nos levar para o espaço outra vez. É um privilégio poder vê-lo descolar.

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