Filologia Livre da Pop do meu poluído imaginário

Aviso

Esta coluna dedica-se à análise de grandes letras da história da pop, desrespeitando deliberadamente quaisquer direitos (ou intenções) do autor.

FUK U IN THE ASS, 1994

THE OUTHERE BROTHERS

 

 

Este dossier fez finalmente levantar o pó da minha carunchosa secretária. E ao contrário dos outros “relatórios de verdade” que são resultado de profunda investigação e da eficiência da rede de informações que com venerada parcimónia soube construir ao longo dos anos, este entrou-me literalmente a voar pela janela da minha semi-cave no bairro da Lapa, com um ligeiro odor a urina, e com a palavra “Intelligent Report” desbotada. No canto inferior direito, um selo rasurado cuja origem é impossível de determinar à primeira vista.

No topo da página um post-it: “Tenho acompanhado de perto o seu trabalho de investigação sobre as camadas ocultas de conteúdos de manipulação de massas. No actual momento achei por bem enviar-lhe algo que esclarecesse devidamente o mundo acerca dos verdadeiros contornos da actual crise financeira. Engula tudo depois de ler. Ou queime”. Anónimo.

Perante tal aviso coloco os óculos. Abro o dossier. Presa com um clip e com o tag “The Outhere Brothers” está uma fotografia de dois homens negros com ar de rappers, ou isso. Confesso que perdi a grelha tipológica da primeira metade dos anos 90.

Na segunda página, uma folha com o selo da Casa Branca. Que imediatamente ligo ao que tinha visto na capa. Nessa folha, no topo, escrito à mão está o título “ Fuk you in the ass” e, por baixo, aquilo que parece ser a letra de uma canção, que imediatamente identifico como o enorme sleaze hit do underground que tomou
conta de todas as pistas das mais respeitadas discotecas de província em todo o mundo e um ou outro Pacha em algumas capitais, durante a década de 90. No fim da folha em jeito de dedicatória estava escrito – “to Monica from Bill”. 

Caí da cadeira. E dado que estou em tratamento às costas, não tive sequer vontade de me levantar e deixei-me estar a ler deitado. O bottom line era que Clinton era o responsável por um dos maiores hits do house escorregadio e a palavra “Monica” não me deixava dúvidas. Não precisei de ler as notas que o meu informador tinha deixado para perceber imediatamente que o que eu tinha na mão era um papel histórico que atestava acima de qualquer dúvida a tusa que Monica Lewinsky dava a Bill enquanto passarinhava pelos corredores da Casa Branca com o seu ar de leitãozinho. Pelos vistos os gostos do Presidente tinham tido uma outra fase antes da oral. Ou, eventualmente, tratava-se de um daqueles raros casos em que as fases são concomitantes, ou se alternam em períodos distintos da evolução.

Mas… o que é que um bilhetinho provocatório, com certeza um passatempo do ex-Presidente entre reuniões com o seu staff, tinha a ver com a crise financeira actual?

As páginas seguintes do dossier serviram apenas para confirmar a minha fé religiosa na teoria do caos.

Pelos vistos Bill, além de saxofonista, ex-presidente e poeta erótico (para ser amigo), era também muito distraído. 

Naquela altura, na Sala Oval, estava na ordem do dia a pressão que era preciso fazer em cima da Fannie Mae, a maior tomadora de crédito à habitação dos U.S., para expandir os créditos à habitação às pessoas com rendimentos baixos. Era um processo de negociação diplomático que implicava compromissos da parte da administração e uma complexa engenharia financeira que deveria criar mais-valias que permitissem uma profunda reforma na forma como os mais pobres viviam na sociedade americana.

Ora, pelos vistos, no momento
exacto em que Bill estava a terminar o bilhete, os assessores responsáveis pelo dossier do crédito hipotecário irromperam pelo seu gabinete e Bill atrapalhado escondeu o papel no primeiro dossier que viu sobre a mesa.

E não mais o conseguiu tirar. 

Aquele era o dossier com as directivas da administração, que serviria de base à negociação a decorrer no dia seguinte com a Fannie Mae e a sua negociadora Monica Lothar.

Consta que ao abrir o dossier na frente dos assessores, Monica Lothar, depois de recuperar o fôlego e puxar a saia para baixo com um movimento inconsciente, aquiesceu solenemente com a cabeça e resolveu obedecer ao Presidente pondo em prática um plano com base naquelas directivas, que ela achava integradas dentro do estilo de Bill de fazer política, uma abordagem emocional, informal e descritiva de forma a estabelecer pontes relacionais com o interlocutor. Sim, porque ela não iria ficar toda a vida a tratar de crédito hipotecário e só lhe faltavam seis meses para concluir o doutoramento em ciência política. 

E o dia de hoje e a crise que vivemos provam como o excesso de zelo e a ultra competência podem acabar com o mundo.

Bom, mas se ficamos a perceber a origem da crise, falta perceber como é que o bilhete sai das mãos de Monica Lothar e acaba nas pistas de dança do mundo inteiro. 

Parece que Monica foi para casa e resolveu guardar o bilhete de Bill debaixo da almofada. O marido, que era desempregado e aparentemente dava na meth, viu o bilhete e resolveu convencer o dealer a trocar aquela letra por uma dose. O dealer, como tantos outros, um produtor de rap em ascensão, viu ali uma oportunidade e daí a colocar em estúdio aqueles que viriam a ser conhecidos como Outhere
Brothers foi um pulinho.

Deixo-vos, não com a análise possível da mais literal letra da pop, mas sim com uma chamada de atenção para a destreza de Bill na captura do momento e na força das suas imagens. É como estar lá com ele sentado a seu lado na sua secretária da Casa Branca e ver Monica entrar e sair do gabinete.

I’ve been watching you

And I love the way you move, Ah Yeah

There is something on my mind

I want to do with your behind, Baby

There’s a passion that I feel

And you know that I’m for real, Baby

I cannot let it pass

I’ve got to have some of that ass
right now

 

I want to fuck you in the ass

(right now)

I want to fuck you in the ass

I want to fuck you in the ass

(uh huh)

I want to fuck you in the ass

I want to fuck you in the ass

I want to fuck you….

 

If you’re moving just like that (?)

Cuz I like it from the back, ah yeah

You look so sexy when you move and

You know I can’t refuse your love

So bend over baby please

Bring your sweet booty to me right now

So DJ make it last

Let me work this big ‘ol ass, baby

 

Oh

I want to fuck you in the ass

(right now)

I want to fuck you in the ass

I want to fuck you in the ass

( I wanna fuck you in yo ass)

I wanna fuck you in the ass

I wanna fuck you….

 

I can’t wait to get you home

Cuz I want to make you moan, Sweet Thang

Want to do it to you deep

Gonna put your ass to sleep, Baby

Candlelight and Vaseline

It is such a freaky scene, Oh yeah

So bend over, Don’t be Shy

I’ve got a tear in my eye, Babaaaaaay

 

I want to fuck you in the ass

I want to fuck you in the ass

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